quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Do Nominalismo

Eram pouco mais de sete da noite. Entrei em um pequeno restaurante chinês na Zona Sul do Rio de Janeiro. "Entrei" seria forte, já que na verdade as mesas ficavam na calçada, e não saberia dizer em que medida essa disposição das mesas no meu caminho não foi determinante na minha decisão de interrompê-lo para saciar minha fome por ali mesmo. "Restaurante" também seria exagerado, dado que na verdade se tratava de um botequim de orientais, que oferecia a culinária chinesa menos por uma intenção mercadológica de promoção da gastronomia de sua terra natal que pela falta de familiaridade com a nossa culinária.

O restaurante - por assim dizer, a título de pragmatismo terminológico - era gerenciado por um homem, que cuidava do caixa, e tinha como único funcionário um outro rapaz, também oriental., que fazia as vezes de garçom e, vá lá, "chef". O gerente-caixa, que devia lá ter seus quarenta e tantos anos, estimados pelo rosto e a barriga, parecia sempre ralhar com o garçom, um rapaz esguio que não ultrapassava os vinte e cinco anos. O gerente/caixa reclamava alto com o garçom, na língua materna, e as outras pessoas espalhadas pelas mesas não disfarçavam o desconforto - não exatamente pela agressividade do patrão, mas pela completa impossibilidade de se inteirar o assunto. Talvez ele estivesse só reclamando da ineficiência do garçom em atender à demanda daquele horário, mas talvez ele estivesse reclamando do descuido do rapaz por não ter jogado fora um rato morto que apareceu no fogão.

Enquanto aguardava pacientemente o garçom atender os demais fregueses, me pus a observar os pedidos da mesa ao lado. Um homem, sentado sozinho à minha esquerda, pediu um yakisoba de frango. O garçom repetia o pedido enquanto anotava: "Yakisoba de flango e coca-cola". Fiquei a pensar se na hora de anotar o pedido, considerando a anotação exigia a compreensão somente dele mesmo, a anotação seria em português ou chinês.

Nisso, uma revoada de pombos imundos vinda sabe-se-lá de onde pousou e se alojou na calçada, promovendo outro explícito incômodo na povoada freguesia. O garçom, sem demora, correu para cima dos pombos gritando "Sai, flango! Sai, flango!". Os outros fregueses se divertiam com o equívoco do rapaz. O homem à minha esquerda não.

Nisso, o garçom percebeu minha mesa vazia, se voltou para mim e perguntou pelo meu pedido.

- Só uma coca-cola. Sem limão.

"Coca-cola", aqui ou na China, ainda é coca-cola. Mas àquela altura, algo me dizia que era melhor não saber o que aquele rapaz chamava de "limão".

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