quarta-feira, 9 de junho de 2010

O caminho das pedras

Andei pensando. Literalmente.

Não sei o que é, mas me faz sentir bem.

Ignoro o percurso, porque enquanto caminho sou todo cérebro.

Há quem já tenha dito que no andar alguma transcendência toma forma no espírito e é apenas enquanto estamos andando que a existência se mostra a nós por completo. Bom, há também quem diga o contrário.

Os que meditam, por exemplo, dizem do corpo imóvel a urgente possibilidade do encontro com o superior – estado da alma que escapa a esses brutos que por aí se mexem à toa.

Mas se assim fosse, creio que haveria muito mais mérito nas estátuas vivas que o que de costume atribuímos a elas - essas que assombram nossas praças pintadas em pelo, muitas das vezes segurando um livro atilado em um tecido da cor da tinta que trazem no corpo e fechado, como se a leitura ultrapassasse a razão: - “Estátuas não lêem!”, bradam elas em silêncio, com o corpo imóvel e os lábios batidos, mas infladas daquela mesma sabedoria que os monges budistas se valem no exercício da meditação.

Ficar parado? Que merda de sabedoria é essa?! Não me admiraria se o Buda fosse ainda mais gordo que o que se vê naquelas estatuetas, embora isso também não seja tão provável.

Por isso, eu ando. E nem por isso limito a consciência, que trabalha tangente ao corpo em suas próprias demandas. Quarenta minutos à fio, até que cansem as pernas; porque a mente não pára e tem vida longa muito além desses músculos mecânicos, motores; e anda sozinha na periferia do olhar vagabundo, compreendido entre o trajeto do corpo que guia e as não-bordas que à volta se quase enxergam.

Filosofia de vida, eu diria. Andar pensando (ou seria pensar andando?). Ainda que possa dar nota aos modelos que passam, ou parar pra tomar um açaí (caso tenha dinheiro), é o andar quem descreve a atividade.

Rezam, os mais comprometidos com a filosofia, que se deve sempre andar sem destino.

Eu, por acaso, parei na frente desse puteiro. Um dos mais sujos da cidade. Mas o que não tem brilho na face compensa no preço. Agora, as protagonistas são as pernas de terceiras. Verdade que ainda estou sóbrio demais pra encarar uma dessas...

Enquanto isso, escrevo.

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