sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Bebo, logo existo.

Sem inspiraçao ou um problema epistemológico perfeitamente a mao, resolvi por em prática o metodo das últimas noites: uma bebida e um tema.

Poucos percebem que a bebida, por si só, é já um tema. No entanto, não deveriam se perguntar, aqueles que o percebem, sobre a probabilidade de serem ou não alcoolatras? De qualquer modo, hoje a coisa nao me parece lá muito afiada. Vou de Domecq: Se o resultado nao valer um suspiro interessado de minha catatônica intelectualidade, ou ao menos umas risadas, pelo menos nao doeu no bolso.

A consciência se move um pouco antes da marretada que irá levar: Domecq puro? Um limaozinho daria pra quebrar um cadinho o tino de "alcoolatra inveterado".

Não tem limao.

Gelo?

Nem pensar. Pior que a sina do bêbado imundo é Domecq aguado.

E o tema chega logo depois, como natural consequência da vida que levo e que insiste em tomar forma nas minhas consideraçoes filosòficas. Minha casa fede. É o mesmo cheiro que associaria a minha vida se eu pudesse colocar nestes termos o problema da existência. Minha vida fede. O cheiro do Domecq é o melhor cheiro que me passou pelas narinas o dia todo.

A bem da verdade, o nariz me é táo inutil quanto um abridor de latas para um aborigene na selva. Nunca deixei de cumer uma sequer empada por julgar o cheiro desagradàvel. Tomo banho apenas pra arrancar do corpo os pedaços de comida que vão ficando presos em mim com o passar da semana. Me serve menos ainda que o pau, esse nariz torto e exibido que trago na cara. Se não o tivesse, respirava pela boca. Não faria a menor diferença.

(Como um experiente somelier e ao contradito das minhas palavras, dou uma boa inalada no copo. Segue-se o gole. E o Domecq está onde deveria. Desce mais uma dose! Grito pro barman... que sou eu mesmo)

Quem leva a sério um existencialista servido a Domecq? Pois digo isto: há tanta dignidade ali quanto em qualquer Uísque de 8 anos pra baixo.

(O vômito quase se antecipa a minha sobranceira conclusão, mas ficou parado no exôfago e voltou pro bucho)

Não é a bebida, tenho andado mal do estomago nessa ultima semana. A bebida, ao contrario, só ajuda. Foi o que disse o meu mèdico... que também sou eu mesmo e segura um copo atè a metade com Domecq em uma das mãos.

Viro mais uma dose. Depois da terceira o organismo assenta. E o vômito vai ter que esperar o sono. So vai aparecer quando eu já estiver dormindo. Dormir me concede alguma especie de licença existencial, quase como quando estou bêbado por completo. Não me envergonho de nada que não possa me lembrar. Menos ainda do que se teve apenas em sonho, onde posso estuprar uma freira, espancar um velho com dificuldades de locomoção e me cagar todo. Se quando eu acordo a merda aparece como que pra dizer que a cagada do sonho foi real, foda-se. Se a policia aparece na minha casa com uma freira aos prantos, aí sim eu começo a me preocupar.

Enquanto isso, o Domecq me serve de aviso. Vai a terceira dose e a cadeira jà começa a balançar. Me vem a cabeça um problema fenomenologico: é a cadeira que balança ou é a minha percepçao que impõe movimento á cadeira? A resposta vem com o tombo e a dor que depois vai ficar nos quadris: era a cadeira que balançava. Mas não foi uma só gota da bebida ao chao. O copo tava vazio. Existe lá alguma coordenaçao entre as idéias e esse corpo surrado que as contem. Pra confirmar o equilibrio, encho o copo e viro mais uma dose. Uma constataçao: o copo vai sempre direto à boca, nunca erra. O importante é nao prolongar o tempo que o Domecq fica no copo - logo depois de ter saido da garrafa e antes de entrar pela goela. Coordenaçao é ritmo.

Na quinta dose o primeiro sinal de fraqueza. Ao me perguntar sobre o problema da unidade do ser - como posso ser ao mesmo tempo minha cabeça e meu braço sem que meu braço e minha cabeça nao sejam individualmente? - um vacilo no manejo e a bebida escapa pelas bordas e molha o chão. É o sono chegando. Existência com as horas contadas. Pelo menos ate amanha de manha. O corpo reclama: quer deitar.

Vou dar uma cagada antes... pra não acontecer como na ultima noite.

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